domingo, 23 de outubro de 2011

POSSIBILIDADE DE PARCELAMENTO DAS DÍVIDAS DOS SIMPLES JUNTO À RECEITA

Apesar de a Lei Complementar nº 123/2006, que instituiu o SIMPLES NACIONAL, não ter previsto a possibilidade de parcelamento dos débitos oriundos desse regime diferenciado de tributação, pode-se afirmar que é perfeitamente cabível o parcelamento, sobretudo pelos seguintes motivos: a) a vedação ao parcelamento de débitos apurados no fere o Princípio da Isonomia; b) a Constituição garante tratamento diferenciado e favorável às micro e pequenas empresas, visando incentivá-las sobretudo pela simplificação de suas obrigações tributárias; c) a Lei Complementar n. 123/2006 não impede a concessão de parcelamentos de débitos fiscais de microempresas e de empresas de pequeno porte; e, d) a Lei n. 10.522/2002 não proíbe o parcelamento de débitos do SIMPLES NACIONAL (do que se infere que há nítida adequação de empresas optantes pelo Simples ao conceito exteriorizado pelo artigo 10 da Lei).

Neste caminho, consoante dito acima, é evidente que a vedação ao parcelamento de débitos apurados pelas empresas optantes pelo SIMPLES NACIONAL fere o Princípio da Isonomia, porquanto todas as demais empresas optantes por outra forma de tributação que não o SIMPLES podem parcelar suas dívidas.

Como afirmou Rui Barbosa, ao discursar para os formandos em Direito da Universidade de São Paulo em 1920, e resgatando a proposta de igualdade pugnada por Aristóteles, "a regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Nessa desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade." (In: Oração aos moços. São Paulo: Martin Claret, 2003, p. 39.)

Neste mesmo sentido, Alfredo Augusto Becker salienta que: “desde logo, cumpre ter sempre bem claro, que o referido princípio de igualdade é o da igualdade geométrica {proporção) e não o da igualdade aritmética (quantidade). Partindo-se do fato científico de que os homens são iguais na biologia e na psicologia, a evolução social tem sido no sentido de se igualizarem geometricamente os homens em tudo que seja desigualdade aritmética de indivíduo para indivíduo. E esta gradual e sempre maior tendência à igualdade geométrica entre os indivíduos, que a evolução humana tem revelado, é regida pelo principio de igualdade que consiste em tratar desigualmente aos indivíduos desiguais, na proporção em que eles se desigualam.” (Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p. 194-195)

Ora, ante a explanação acadêmica acima noticiada, fica evidente que não há razão plausível que sustente o fato de as empresas optantes pelo SIMPLES não poderem fazer parcelamento de seus débitos. Na verdade, tal discriminação para com as empresas optantes do SIMPLES é odiosa e, portanto, vedada por nosso ordenamento jurídico.

Aliás, é um verdadeiro descompasso conceder parcelamentos a grandes empresas e a grandes devedores e negá-los a microempresas e a empresas de pequeno porte.

Em outras palavras, no mínimo, tal situação cria um grande contra senso, pois enquanto o parcelamento ordinário pode ser utilizado a qualquer momento pelas grandes empresas nacionais, normalmente possuidoras de maior capacidade contributiva, a Receita Federal barra a adesão ao parcelamento das micro e pequenas incluídas no SIMPLES.

Ainda mais se levar-se em conta que o tratamento diferenciado outorgado às microempresas e às empresas de pequeno porte constitui um direito destas, e não favor fiscal, direito este que não é incompatível com a concessão de parcelamentos.

Além da afronta aos Princípios Constitucionais da Legalidade e do Tratamento Favorecido às Microempresas, vale salientar que a Lei Complementar n. 123/2006 não impede a concessão de parcelamentos de débitos fiscais de microempresas e de empresas de pequeno porte.

Ao longo de todo o corpo de tal lei não há norma que, expressamente, vede tais parcelamentos. Aliás, interpretando-se tal norma a contrario sensu, pode-se, inclusive, afirmar que ela admite o parcelamento.

Vejamos o artigo 17, inciso V, da aludida Lei: "Art. 17. Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte: (...); V - que possua débito com o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja exigibilidade não esteja suspensa; (...)"

Assim, levando-se em consideração que o parcelamento suspende a exigibilidade do crédito tributário e que a legislação do SIMPLES só determina a exclusão dos contribuintes que possuam débitos cuja exigibilidade não esteja suspensa, afigura-se correto pensar que: a) não há incompatibilidade entre a forma de tributação instituída pelo SIMPLES com a concessão de parcelamentos de débitos fiscais a microempresas e a empresas de pequeno porte; b) não é possível negar à microempresa e à empresa de pequeno porte a concessão de parcelamento, como meio de coagi-la a efetuar o pagamento à vista de seus débitos, inclusive, sob pena de exclusão do aludido regime.

Isso tudo sem se esquecer que a antiga Lei que regulamentava o regime de tributação simplificado, Lei n. 9.317/96, previa expressamente em seu artigo 6°, § 2° que: "os impostos e contribuições devidos pelas pessoas jurídicas inscritas no SIMPLES não poderão ser objeto de parcelamento."

Assim, se a Lei Complementar 123/2006 não vedou expressamente o parcelamento, é notório que, fazendo-se uma interpretação a contraio sensu, o mesmo é permitido.

Ora, tal interpretação é deveras razoável, ainda mais se levando em conta a necessidade de dar tratamento mais favorável às micro e pequenas empresas.

Acerca do tema, ensina Roque Carrazza que: “Deveras, dispensar tratamento diferenciado e favorecido, em matéria tributária, às microempresas e às empresas de pequeno porte, é reconhecer-lhes as peculiaridades e, ao fazê-lo, eximi-las, o quanto possível, de tributação. (...) Por outro lado, eventuais dúvidas que a legislação tributária possa, a respeito, suscitar devem ser solvidas em favor das microempresas e das empresas de pequeno porte.” (CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 284).

Ademais, também há que se lembrar que a Lei n. 10.522/2002 não proíbe o parcelamento de débitos do Simples Nacional. Neste caminho, cabe aduzir que, nos termos do artigo 155-A, do Código Tributário Nacional, com a redação dada pela Lei Complementar n. 104/10, o parcelamento de créditos tributários depende lei específica. Assim, na falta de normatização específica, é evidente que o parcelamento ordinário de débitos fiscais federais, instituído pela Lei n° 10.522/2002, a qual estabelece que os débitos qualquer natureza para com a Fazenda Nacional poderão ser parcelados em até 60 (sessenta) meses, pode perfeitamente suprimir tal lacuna.

Como se nota, o benefício previsto na lei do parcelamento ordinário pode ser utilizado por qualquer empresa em dificuldade e com pendências tributárias, pois tal norma não faz distinção da empresa ou da sua opção de regime de tributação (lucro presumido, lucro real ou simples nacional), somando-se isso ao fato que, como já dito, a Lei Complementar n° 123/2006 também não veda o expressamente que os optantes do SIMPLES possam valer-se de tal direito.

Assim, se a Lei Complementar 123/2006 não vedou expressamente o parcelamento, e havendo lei que regulamenta o parcelamento ordinário, é evidente a possibilidade de parcelar a dívida.

É importante salientar que o fato de a forma de tributação instituída pelo SIMPLES NACIONAL englobar tributos municipais, estaduais e federais, não traz nenhum empecilho para o parcelamento, porquanto todos os impostos são tratados de maneira discriminada e plenamente identificável. Aliás, o próprio § 2°, do artigo 41, da Lei Complementar 123/06 prevê expressamente que "os créditos tributários oriundos da aplicação desta Lei Complementar serão apurados, inscritos em Dívida Ativa da União e cobrados judicialmente pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional." Assim, se os débitos do Simples são apurados, inscritos em Divida Ativa da União e cobrados judicialmente pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, é impossível alegar que não são administrados pela Receita Federal do Brasil, do que se infere que a própria Fazenda deve permitir o parcelamento.

Por força de argumentação, e demonstrando o notório direito a que fazem jus os contribuintes enquadrados no SIMPLES, cabe lembrar que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar n° 591/2010, o qual, dentre outras medidas, traz em seu bojo a previsão de criação do parcelamento automático, específico às empresas optantes pelo Simples Nacional que se encontram em débito perante o Comitê Gestor.

Assim, como ficou exposto, há nítida possibilidade de parcelamento dos débitos fiscais pelas empresas enquadradas no SIMPLES NACIONAL.

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